ADORAÇÃO NO ANTIGO TESTAMENTO: RELEVÂNCIA PARA HOJE


A adoração no Antigo Testamento, durante o culto, era caracterizada por uma série de detalhes, regras, rituais e exigências que hoje, pela obra de Jesus, não fazem mais sentido para a Igreja. Alguns elementos do culto em Israel, próprios daquela cultura, são incoerentes em nossa cultura ocidental. A tentativa de alguns grupos contemporâneos, de “judaizar” o culto cristão, utilizando inclusive elementos antigos e modernos do culto israelita (tais como toques de shofar, bandeiras de Israel, estrela de Davi, vestes especiais, etc), parece ser mais um desejo fútil e artificial de deslumbrar e emocionar os participantes do culto do que um modo sincero, transparente e aceitável de adorar a Deus.

O adorador nos tempos da Lei devia obedecer a uma série de regulamentos: dias especiais (sábados, dias de festas, o dia anual do perdão, etc) e lugares especiais para o culto (o Templo, principalmente, e as sinagogas, a partir do exílio babilônico). Para a mulher à beira do poço de Jacó, na cidade samaritana de Sicar, Jesus ensinou que era chegado um novo tempo, em que a adoração não mais dependeria de dias ou locais especiais (cf. Jo 4.19-24). Entretanto, o caráter comunitário da adoração seria mantido: no Novo Testamento, há uma ênfase especial à Igreja como templo ou santuário do Espírito Santo (1Co 3.16; Ef 2.19-22; 1Pe 2.4,5), que se manifesta quando nos reunimos, juntos, para a adoração. “O Novo Testamento enfatiza a adoração comunitária. Em Efésios 5.19 e Colossenses 3.16 a igreja primitiva é instruída a cantar salmos, hinos e cânticos espirituais” [1]. Por isso, o autor de Hebreus nos insta a jamais deixarmos de nos reunir (Hb 10.25). Desde a era apostólica, a Igreja separou o domingo como dia de adoração (At 20.7; 1Co 16.1,2), chamando-o “Dia do Senhor” (Ap 1.10), pois foi o dia em que Cristo ressuscitou. Porém, o Novo Testamento insiste, igualmente, em que a adoração e o culto a Deus devem ser uma constante na vida dos cristãos (Rm 12.1,2).

As principais características do antigo culto do povo hebreu eram a atitude solene de temor e reverência diante da majestade e da santidade de Deus, e a mudança de vida decorrente do encontro com Deus, na adoração. Vemos essa atitude em Moisés, que “cobriu o rosto, pois teve medo de olhar para Deus” (Ex 3.4-6); em Jó, que declarou: “Meus ouvidos já tinham ouvido a teu respeito, mas agora os meus olhos te viram. Por isso menosprezo a mim mesmo e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42.5,6); em Isaías, que exclamou: “Ai de mim! Estou perdido! Pois sou um homem de lábios impuros e vivo no meio de um povo de lábios impuros; os meus olhos viram o Rei, o SENHOR dos Exércitos!”; em Ezequiel, que se prostrou, “rosto em terra”, diante de Deus (Ez 1.28); em Daniel, que caiu prostrado diante do mensageiro do Senhor (Dn 8.15-18).

O Senhor manifestou-se também a todo o povo de Israel, no deserto, sobre o monte Sinai, e o povo, “diante dos trovões e dos relâmpagos, e do som da trombeta e do monte fumegando”, disse a Moisés: “Fala tu mesmo conosco, e ouviremos. Mas que Deus não fale conosco, para que não morramos” (Ex 20.18-21). “Esses encontros foram muito diferentes uns dos outros, mas há semelhanças importantes entre eles. Deus apresentava-se em sua majestade como Senhor. O adorador era tomado por um temor reverente. O controle, a autoridade e a presença do Senhor impunham-se com absoluta evidência. Sua força e seu poder eram esmagadores; falava uma palavra de autoridade e revelava-se na presença do adorador. Este não permanecia o mesmo. Saía da experiência com uma nova missão: servir a Deus com renovada dedicação” [2]. Assim, o adorador, na presença de Deus, sabia que estava diante do Rei dos Reis, do Todo-Poderoso Criador e Senhor, do Santo, do Deus Altíssimo. Não havia espaço para vaidades ou futilidades; tudo era reverência, admiração, louvor, temor e gratidão. Além disso, um encontro com Deus produzia, inevitavelmente, uma transformação radical no adorador. Ninguém – ninguém -  sai “impunemente” de um encontro real com Deus.

Precisamos resgatar essa reverência, esse temor santo, diante do Senhor da Glória, se quisermos adorar verdadeiramente. Como disse Robert W. Bailey: “Não podemos adorar de forma correta até reconquistarmos, como elemento principal da adoração, a consciência tremenda de temor e reverência na presença de Deus” [3]. Não devemos confundir essa reverência e esse temor com estilo de culto. Aqui estamos falando de um estilo de vida. Os cultos podem ser mais formais ou informais, mais espontâneos ou planejados, porém temor e reverência diante da majestade divina é algo que se requer em todos eles, em toda a nossa vida, sempre. Os antigos hebreus cultuavam das duas maneiras: “Quando a nação de Israel cruzou o Mar Vermelho, bem ali na margem eles irromperam em adoração espontânea que incluiu canto, instrumentos e dança (Ex 15). Por outro lado, o tempo de adoração que acompanhou a dedicação do templo foi minuciosamente organizado e coreografado (2Cr 5.11; 7.7)” [4].

Outra característica do adorador nos tempos do Antigo Testamento é que o povo hebreu tinha plena consciência de ser um povo santo, isto é, separado para o Senhor. Dentre todas as nações do mundo, os israelitas haviam sido escolhidos como povo de propriedade particular do Senhor (Ex 6.6,7; 19.5,6). Portanto, deveriam viver em santidade, em obediência a Deus, cumprindo todas as exigências da Lei (observe, por exemplo, o Salmo 15, como exemplo de conduta e integridade esperadas de um adorador). O culto sem santidade, sem integridade e sem temor a Deus, é um insulto ao Senhor. O profeta Isaías começa seu livro denunciando o culto hipócrita prestado por Israel a Deus, em um tom bem duro e sombrio (veja Is 1.10-17). “Deus não aprova a hipocrisia. Em Amós 5.23, o Senhor está farto da hipocrisia de Seu povo, e especialmente de sua música: ‘Afasta de mim o estrépito dos teus cânticos; porque não ouvirei as melodias das tuas liras’. Deus não irá ouvir canções de louvor vazias, não importa quão criativas ou bonitas elas sejam, se nossos corações não estiverem retos diante Dele” [5]. E por meio do profeta Malaquias, o Senhor deixa bem claro que não aceita culto sem a honra e o temor devidos (Ml 1.6; 2.1,2). Vida em santidade, consagração e caráter íntegro não são opcionais para o servo de Deus. Sem uma vida dedicada ao Senhor, não pode haver adoração verdadeira. Essa foi a lição que os israelitas tiveram de aprender (Ne 9.29-37; 10.32-39).

Temor, reverência, santidade, integridade. Atitudes que o Senhor espera de Seu povo. Atitudes que devemos ter em nossas vidas, se de fato queremos ser verdadeiros adoradores.


NOTAS:

1. NOLAND, Rory. O Coração do Artista: construindo o caráter do artista cristão. São Paulo: W4 Editora, 2007, p. 21.
2. FRAME, John. Em Espírito e em Verdade. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p. 38.
3. ALLEN, Ronald; BORROR, Gordon. Teologia da Adoração: o verdadeiro sentido da adoração. São Paulo: Vida Nova, 2002, p. 42.
4. NOLAND, Rory. O Coração do Artista: construindo o caráter do artista cristão. São Paulo: W4 Editora, 2007, p. 22.
5. NOLAND, Rory. O Coração do Artista: construindo o caráter do artista cristão. São Paulo: W4 Editora, 2007, p 32.

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